sexta-feira, 27 de junho de 2008

Aniversários

Eu simplesmente esqueço o aniversário de todo mundo. Na verdade, não esqueço-esqueço: normalmente lembro, penso em ligar ou deixar scrap, lembro que não tenho crédito e que só posso deixar scrap mesmo, vou pegar um copo d´água e na volta pro quarto ou pra sala aí sim, esqueço e só lembro, se lembrar, dias depois. Isso só não acontece quando sou convidado pra festinha hip hip hurra ou quando a aniversariante é a minha mãe. E olhe que já aconteceu dela esquecer o meu na cara-de-pau, mas se o contrário rolasse, a coitada ficaria triste de verdade comigo e isso teria consequências para além do sentimental. Sem contar que que, como já não sou o melhor dos filhos no quesito comportamento e dedicação, nada como lembrar, felicitar, passar o dia junto, comer do almoço delícia, comprar uma lembrancinha e fazer toda papagaida de dia especial que não consigo me bem acostumar. Pois é, não acho meu aniversário o melhor dia do mundo: acho um tédio e acho um tédio maior ainda ter de obrigatoriamente acordar de bom humor. Aniversário é um ritualzinho muito do besta e do vaidoso. Basta lembrar uma vez por ano e basta demais. Exceto os que vêm acompanhados de BLs e segundas intenções, pois esses serão lembrados até no pós-túmulo. Enfim, é por essas e outras, que desejo parabéns pra quem fez aniversário no dia 21 ou 25, pra que vai fazer no dia 28, pra quem fez no mês todo de junho, pra quem fez dia 2 de maio e pra quem vai fazer daqui pro resto do ano inteiro.

Talvez em 2009 eu mude de perspectiva e arrume um aniversário para cada dia do ano.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Meninos do Estado

Depois de escrever, apagar e re-escrever esse post mil duzentas e quarenta e três vezes, resolvi deletar tudo e ir direto ao ponto: minha amiga Carolina Vanderlei, a famosa Carol tão citada nesse espaço, antiga revisora oficial dos meus escritos e também conhecida como a Laura Palmer do meu coração, finalmente decidiu se formar em jornalismo e, como trabalho de conclusão de curso, criou a revista digital Meninos do Estado. Não vou adiantar do que trata a revista só para dar o gosto da curiosidade pré-click e, principalmente, porque a série de matérias se justifica por si só, de modo que qualquer palavra minha, agora, poderia soar irrelevante. Pois é, como você bem desconfiou, esse post não passa de uma propaganda descarada antes do tempo de campanha, então como bons (e)leitores passivos que são entrem lá e leiam. Por sinal, se quiserem aparecer, e talvez Carol me mate pelo convite aberto, a apresentação dela vai ser quinta-feira, às 16 horas em algum lugar sombrio do CAC. Recomendo aos graduandos mais jovens: é sempre bom ver o cu dos outros na roda antes de ter de colocar o seu.

E na sequência vai ter cerveja.

sábado, 21 de junho de 2008

Eurocopa e a Colonização

Gostaria sinceramente de passar alguns posts sem comentar de futebol ou derivados, mas não tenho como me ausentar diante da transmissão estapafúrdia da Eurocopa feita pela Rede Record. Está acabando, mas aproveitem, cada partida acumula constrangimentos ao vivo daqueles que terminam no youtube e se tornam o vídeo viral do momento. Não vou discutir aqui se os jogos deviam ou não estar na grade de programação da televisão brasileira, se é um absurdo estarem no lugar de uma produção nacional ou todo blá blá blá paradoxal das cotas. Alguns defendem, outros não e a vida continua. Por ora, prefiro me ater à forma como o narrador insiste em costurar um sensacionalismo muito desprendido da realidade, uma realidade vista diretamente pelo espectador, ao comentar, por exemplo, que todos os jogos, inclusive o empate sem gracinha e sem belas jogadas entre Polônia e Áustria, estão se firmando como 'grandes espetáculos'. É notável a influência radiofônica do exagero e da rapidez num sentindo de manter o ouvinte atento, o que se mescla a um discurso colonizado patético que termina por erguer a Eurocopa ao patamar de 'mais que futebol', onde absolutamente todas as partidas 'vão entrar pra história do futebol mundial'. Nostradamus já dizia que no dia em que Eslovênia e Letônia forem grandes clássicos do futebol, o mundo realmente não terá mais chance diante do juízo final. Nos primeiros jogos que eu vi, imaginei que o narrador estava tão egolombrado por ter conseguido aquele emprego que, além de tudo, criava um mal estar com os comentaristas até que percebi que a cada jogo, tem o comentarista fixo, um ex-jogador, e outro convidado escolhido de uma maneira completamente arbitrária. Tipo, o jogo é Itália e Romênia aí chamam um ator nascido na Itália pra comentar. Sério. Ah sim, esqueci de comentar, mas pelo que já escrevi, vocês devem ter percebido, que a equipe obviamente está fazendo a transmissão assistindo pela televisão diretamente do Brasil. Os erros são inúmeros, o jogador X vira o Y depois vira Z e isso para não falar que o narrador claramente escolhe algumas seleções pra torcer e fica insistindo para que o telespectador o acompanhe na torcida. Portugal era a seleção queridinha por causa do treinador brasileiro, pelo compartilhamento da mesma língua e por ter em seu time Cristiano Ronaldo, 'a estrela maior da competição'. Realmente se existe um manual de transmissão de jogos da Record, ele só pode ter sido escrito por um humorista irônico com nosso complexo de colonização.

Tarantino's Mind

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Cannes, 1991, Véronique

A Palma de Ouro do Festival de Cannes é uma iguaria refinada, quase um atestado de qualidade fílmica ao cinema anacronicamente ainda chamado de autor. E não se trata apenas de um isolado apadrinhamento da obra, afinal carrega consigo a consagração de um cineasta ou mesmo a revelação dele como uma futura promessa à cinefilia mundial. Cannes pode servir tanto como plataforma (o atual e exagerado bam bam bam 'cena romena' confirma muito bem isso), quanto legitimação de uma trajetória cinematográfica consolidada (como a de Ken Loach, premiado em 2006 depois de mais de 30 anos de carreira). Não há como negar que alguns dos mais representativos cineastas contemporâneos já tiveram seus trabalhos selados pelo festival: David Lynch (1990), Lars Von Trier (2000) e Gus Van Sant (2003) são apenas alguns deles. Por outro lado, como bons espectadores não devemos supervalorizar essa premiação, a própria lógica de competição deveria pouco nos importar, pois os júris são modificados a cada ano e a escolha parece ser mais por afinidade estética de uma obra daquele ano com o grupo seletor daquele ano, do que uma definição padrão do melhor. Não há propriamente ‘o’ melhor. Todos - e dêem um desconto pela hipérbole - são e não são os melhores a cada ano. Essa instabilidade de julgamento, inclusive, é essencial para garantir a vitalidade e renovação do festival. Por isso, sempre penso que mais importante que saber quem venceu ou qual deveria vencer, é conhecer quem participou e quais primeiras impressões causaram. Daí sim, Cannes revela seu poder de mapeamento de uma produção marcada pela diversidade, por distintas práticas e não pela hierarquização, e se revela como um extenso e variado cardápio cinematográfico. Que chega tarde e frio ao Brasil é bem verdade, mas que devoramos – e é preciso devorar todos e não apenas o dito prato principal - com o mesmo prazer.

Há algo de curioso nessa idéia. Tomemos qualquer data. 1991, por exemplo. Naquele ano, na quadragésima quarta edição do festival, estavam em competição, entre outros relevantes (como A Bela Intrigante, de Jacques Rivette e Febre da Selva, de Spike Lee), Barton Fink, dos Irmãos Coen e Europa, de Lars Von Trier. Esses dois últimos, para mim, inquestionáveis em suas propostas. O primeiro por tratar com ironia as saídas possíveis de um bloqueio criativo, a partir da relação metalingüística do personagem título que está escrevendo um roteiro com o próprio roteiro do filme, assinado pelos Coen, no qual o personagem se insere. O segundo pela qualidade técnica impecável, mas principalmente por trazer em si uma afirmação técnica do cinematograficamente belo, conceito chave da Estética, tornando ainda mais firme o argumento do diretor quando, anos mais tarde, adere a uma intenção contrária através do movimento Dogma. Deixa-se o belo como projeto, abraça-se o feio. O que importa é que naquela ocasião, o júri presidido pelo cineasta Roman Polanski escolheu a obra dos Irmãos Coen para levar a Palma de Ouro, enquanto Lars Von Trier recebeu um prêmio ‘secundário’ referente à técnica (e tomando secundário aqui com extrema cautela). É preciso dizer que qualquer resultado em 1991 (e em tantos outros anos) seria justo e injusto. Trata-se mais de uma noção de acaso ou não-acaso do encontro da obra com outras obras, com o consentimento do júri, do que uma mera discussão sobre valoração e hierarquização entre elas. Roman Polanski não compartilharia da escolha com outros presidentes de outras edições como a atriz francesa Jeanne Moreau (1975 e 1995) ou o cineasta inglês Stephen Frears (2007) – ou mesmo com o diretor norte-americano Quentin Tarantino (2004). Hoje, pensando sobre essa crítica, escolhi escrever sobre um outro filme de 1991 também selecionado: A Dupla Vida de Véronique (França, 1991), de Krzysztof Kieslowski. Não que eu ache que ele deveria ser o premiado. Nada disso. No caso das obras aqui citadas, a que saísse com o prêmio principal nas costas jamais poderia ofuscar as demais. Não se enganem: essa ainda é a principal idéia desse texto.

Verónique se mostra peculiar, em primeira instância, por ter sido concebido entre dois projetos extremamente ousados do diretor polonês. Antes, temos o Decálogo (1989) e logo em seguida, A Trilogia das Cores (1993-1994). Em 1991, Kieslowski estava com um pé apontado para França e outro ainda apoiado na Polônia. Só por trajetória, Véronique soa menos pretensioso. Nunca menor. O filme se prende muito mais numa idéia que numa história, tumultuando nosso próprio entendimento e se afastando de uma dimensão concreta das relações humanas para se apegar ao que de invisível interliga e mutuamente influencia as pessoas. A todo o momento é destacado o fato de todos estarmos sós no mundo e não necessariamente estarmos sós; o fato de não podermos determinar a casualidade ou a premeditação de um encontro; menos ainda medir as conseqüências desses encontros (ou dos não-encontros). Nesse sentido, os dois conceitos inversos se tocam, se penetram: tornam-se indiferentes. Se considerarmos que tudo é uma aleatoriedade de fatos, chega um momento que essa lógica se torna igual a do destino: podemos até considerar que o destino é apenas a forma como damos significado às coincidências. Cada uma de nossas escolhas ou atitudes termina pautando as condições das escolhas a seguir e assim sucessivamente. E também acontece o contrário: sem escolha, um carro nos atinge, um infarto nos mata, uma paixão nos manipula. Podemos até cair na estéril discussão de preferência pelo ‘tudo é acaso’ ou ‘nada é por acaso’, mas é preciso ter consciência que ambos os discursos fazem parte do mesmo corpo. Como se opostos sempre taxados de opostos também pudessem ser um só. No filme, Weronica e Véronique (sob a pele da graciosa Irène Jacob), respectivamente na Polônia e na França são a prova de uma ligação invisível que une as pessoas, numa sistemática onde os atos mais insignificantes influenciam todos em volta. Sejam conhecidos ou não. Isso só me faz pensar em todas as pessoas que conheci ao longo de todos esses anos e as que deixei, talvez por muito pouco, de conhecer. Todas elas, uma por uma, fantasmas, penumbras e corpos, terminaram me trazendo até aqui.

Kieslowski não entendia a razão de ter sido convidado para fazer filmes fora de seu país. Acreditava que não produzia nada além de dramas domésticos poloneses, fundados em meros problemas poloneses. Convidado a trabalhar na França, dada repercussão de sua obra por toda Europa, passou a repensar a força de seu microcosmo até enxergar o caráter universal de seus filmes. Como o mesmo disse banalmente certa vez, 'a dor de dente é a mesma em qualquer lugar do mundo'. Talvez por isso, tudo em Véronique seja duplo: encontre um caminho aqui (na metáfora do lugar 01) e outro lá (na metáfora do lugar 02). Vemos que a diferença não é tão radical. Uma brincadeira com um cordão, o gosto pelo anel perto do olho, uma bola que reflete o mundo de ponta cabeça. Alguns costumes se repetem e o diretor impõe a maneira de filmar as personagens e seus reflexos: no vidro do trem, no vidro do ônibus, nos vidros. Tudo é duplo. Existe sempre uma ambigüidade de sentidos: 'sentido' como propósito, 'sentido' como sensação. O artesão cria duas bonecas. No perigo de uma inocência se perder, duas são criadas. O cineasta polonês usa sua câmera quase encostando o foco no objeto, aproxima sua lente até podermos ver as linhas de uma mão, até nos darmos conta de quão perto ou longe podemos enxergar o que nos cerca. Estamos próximos, distantes e conectados ao nosso mundo cotidiano. Penso em Véronique como - e esse é também o objetivo maior de meu primeiro ensaio fotográfico - uma re-educação do olhar e do sentir diante do que banalmente estamos mais acostumados e de uma re-colocação de influências e sustentações na teia da vida. A própria atriz não deixa por menos. Irène Jacob no auge de seus 25 anos não convence apenas por ser delicada, por saber trabalhar o silêncio e a intensidade, mas por toda graciosidade de seus gestos. Há um enigma presente na expressão em seu rosto e a câmera se aproxima até não termos mais dúvidas sobre a solução. E então entramos a fundo em sua tristeza, em sua beleza, em sua solidão. Entramos a fundo nas dores polonesas que são também dores universais. Tudo é sensação – os raios de sol, a ansiedade, o choro compulsivo, um olhar curioso, as mãos sobre a árvore. Todo resto, complementação – o duplo, o outro, o reflexo. E não há engano. A Dupla Vida de Véronique também funciona, talvez forçando para poder concluir o texto, como uma bela metáfora do Festival de Cannes. O encontro (ou o não-encontro) de obras e obras e júris acontece apenas uma vez como por acaso e, a partir dali, transforma o destino de todos: o da obra e seu diretor em si, o da obra diante das outras e do júri diante das obras. Não há como fugir. O resultado do Festival de Cannes sempre será justo e injusto. E assim o é há 61 anos.

Sonhos

Tudo bem que estou oficialmente na rehab, mas sonhar com a Amy Winehouse, assim, duas vezes na mesma semana já é demais para mim.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Shyamalan e as Preliminares


Preciso dizer que no próximo filme do M. Night Shyamalan não vou querer saber absolutamente nada sobre o filme. Pelo menos, não antes de estar sentado diante da tela. Não quero saber se é o vento, se são as plantas, se o Bruce Willis está morto, se são ETs ou se é uma ninfa notória na piscina do residencial dali da esquina. Não me contem, por favor: já me dei conta dos seus temas recorrentes, da razão contestada pela crença e da realidade pela imaginação e, por ora, isso basta. A partir de hoje, vou me esconder de todas as notícias relacionadas, das possíveis sinopses que aparecem na internet antes mesmo de existirem sinopses, dos trailers, das filmagens feitas por seguranças de set e principalmente dos amigos que cinicamente revelam o final do filme na maior cara-de-pau (tipo 'pois é, o Bruce Willis está morto, você não sabia?'). Só a termo de curiosidade, resolvi me ater apenas ao nome temporário: 'The Last Airbender'. Pronto, estou satisfeito. Por sinal, se deixar de ler o Omelete e me garantir só pelo título original, talvez consiga fugir do inevitável mar de informações (e da minha curiosidade louca) e tenha mais chance de chegar como uma tábula rasa ao lançamento. Pergunto-me se a filmografia do cineasta não nos diz de alguma forma que que todo o 'adorno' exterior e anterior à obra é desnecessário e que se usado em doses drásticas pelo espectador, só tende a interferir também drasticamente na experiência estética primeira. Aqui, as preliminares não são lá um sucesso. Admito que exista até um culto aos subprodutos ou derivados culturais e esse culto baseado no excesso de informações e fontes traz um tédio: o fato de chegarmos sobrecarregados de vestimentas e preconceitos na sala de exibição. Dependendo da tradução de seu proximo filme, poderia até ficar confuso e terminar só o assistindo em casa. Provavelmente não. Convenhamos que o nome Shyamalan tem cacife suficiente para surgir antes do título seja qual for. E posso usar essa idéia não de maneira tão trivial ou literal, mas como uma parábola da existência de uma proposta estética, pessoal e arriscada do diretor, característica da qual todos nós sabemos que o cinema americano muito carece (e, não sejamos ingratos, que também muito se orgulha). Sempre vou defendê-lo nesse aspecto e nem sempre apreciá-lo por causa disso.

Acontece que mesmo antes de terminar Fim dos Dias (The Happening), já estava pensando que o Shyamalan funciona melhor quando não sabemos muito sobre ele. Talvez pudesse usar 'O Sexto Sentido' como um bom exemplo disso, mas como o assisti aos 15 anos no cinema (e realmente não sabia nada sobre), prefiro me dar o direito da dúvida diante dessa experiência passada. Melhor seria usar A Dama na Água para ilustrar. Mesmo tendo lido algo aqui e ali, assisti com poucas pré-informações e com as piores pretensões possíveis e saí com uma puta sensação boa. Não é que de um aparentemente momento ingênuo, de uma premissa quase ridícula, Shyamalan conseguiu ultrapassar o campo de simples fábula delicada e nos conduziu através de um jogo de arquétipos do qual podemos extrair algumas de suas conotações de cinema. Enxergo ali uma defesa do contrato de crença entre a ficção lançada pelo diretor e a necessidade de embarque do espectador. É uma pena que todas as outras obras de sua filmografia não tenham conseguido me colocar completamente dentro do trem. Sempre fica engasgado um gostei-e-não-gostei-tanto-assim. Isso me perturba pelo simples fato de ser mais fácil discorrer sobre certezas que sobre incertezas. E com Shyamalan muito me parece incerto. Antes dos respectivos lançamentos de seus filmes, lia muito, muito mesmo, começava a acompanhar desde a idéia as recentes críticas, de modo que mesmo com as surpresas, as reflexões e alguns sustos, terminava sentando diante de um espetáculo 'esperado' demais. E convenhamos, essa é uma situação muito da chata. No caso de 'A Vila', o acontecimento (rá) foi ainda mais radical. Eu até comentei ontem com Hermano - leiam o texto dele - que tinha ido ver sem saber muita coisa. Pura mentira. Lembrei que Cecília me contou tudo. Todo final e tal e tal que não vou contar aqui porque está muito recente e você ali e ali podem ainda não ter visto. Ah, não pensem nada de errado da pobre Cecília. Ela é uma pessoa ótima. Eu totalmente desestimulado com o Shyamalan por conta de 'Corpo Fechado' e 'Sinais' quis sacrificar seu costumeiro maior trunfo: o fim. Daí pedi pra ela contar em detalhes e só dei a justificativa que 'não iria ver mesmo'. Semanas depois assisti e me senti culpado como poucas vezes. Acho engraçado eu ter esquecido isso.

Ontem, quando fui ao Shopping Boa Vista (ou como quiserem chamá-lo) já sabia, por sinopses e afins, que em Fim dos Tempos 'por algum motivo' as pessoas começam a se matar e sabia, pelo cartaz, que ia rolar uma fuga tendo como ponto condutor um homem, uma mulher e uma criança. Daí não precisei muito para deduzir parte do roteiro quando na primeira cena do Mark Wahlberg professor, um aluno questionado sobre o motivo do desaparecimento das abelhas, comenta que existem razões na natureza que nunca poderemos entender completamente. A narrativa me soou muito didática desde esse ponto. Logo depois chegam as notícias e já sabemos que o comentário anterior funcionou como um resumo do que se abateria sobre eles, trazendo aos espectadores, e ressaltando sempre ('são os terroristas', 'são as plantas', 'só ataca em grandes grupos'), a variabilidade do entendimento que podemos ou não ter do fenômeno. Aquela cena me soou como uma justificativa da não-razão dos fatos. Por muito pouco o filme não me perdeu nesse momento, mas aí pensei em Hitchcock e entrei na curiosidade do percurs. Mesmo pouco disposto aceitei o contrato e embarquei no trem. Imaginei que era como o garoto carregando a bomba em Sabotagem (1936). Sabemos que aquela caixa vai acompanhá-lo, que pode matá-lo pois contém uma bomba e não sabemos o porquê da bomba e na iminência da explosão, isso pouco importa. Acho que pensar em Hitchcock foi uma boa saída como espectador. Deu-me fôlego ao que viria a seguir e me abriu a possibilidade de me apegar mais ao imagético que ao narrativo. Foi o que fiz. E nesse ponto, o filme passou a me impressionar muito, principalmente pelas cenas que se desvinculavam do homem, da mulher e da criança. Cenas isoladas como a passagem do ET na televisão, supostamente no Brasil, em Sinais. Em Fim dos Dias tive a mesma sensação várias vezes. Algo que realmente me abateu . Desde os pedreiros se jogando do alto das construções logo no início, passando pelo lindo plano-sequência a partir da morte de um policial (com a câmera rente ao solo acompanhando a arma) até o rapaz se deixando comer pelos leões vistos por um celular. É meio as mil e uma maneiras de filmar um suicídio. Fiquei feliz dele não ter se repetido. Esquecendo a narrativa e se apegando as imagens, não precisei muito pra estar totalmente envolvido pelo espetáculo belamente assustador da auto-destruição substituindo a auto-preservação. Tudo isso em larga escala me causou um temor agradável. Isso fez com que o tom de previsibilidade e dedução fosse esquecido, dando lugar a força das imagens. Pode ser B e divertido, como diz o diretor, mas me tocou de outra maneira. Talvez eu seja um suicida em potencial e não saiba. Vale dizer que entre deduções e previsões, a maior surpresa foi a velhinha que aparece já perto do fim. Pois é, eu e metade do cinema levamos àquele maldito susto. Adoro a balbúrdia pós susto numa sala de cinema. Alguns xingam, outros riem, outros continuam no susto. Mas voltando a velhina, em primeiro lugar não esperava que ela fosse surgir (diferentemente da casa trancada onde os fugitivos são recebidos a bala o que é bem previsível), segundo que sua morte é claramente a mais horror B de todas. Um verdadeiro misto de susto e riso. Dá vontade até de xingar. Pois é, fiquem de olho na velhinha.

PS.: Não posso deixar de comentar que um dos trailers passados foi o de Arquivo X: Eu Quero Acreditar. Como bom fã da série só tenho a dizer que não acredito.

domingo, 15 de junho de 2008

Videogame

Estava almoçando com a tv ligada e pouco prestando atenção, quando a minha sobrinha sentou ao meu lado e falou:

- Essa Eurocopa parece o Playstation.

Parece mesmo.

sábado, 14 de junho de 2008

Pichação


Lembro que quando fui à exposição Estética da Periferia, se bem me lembro no Mamam, achei toda ideia de um péssimo gosto. Não pelas obras em si, nem pelos textos, mas por acreditar que o que estava sendo exibido e discutido ali, em especial ações como a pichação ou grafite se preferir, não fazia sentido isolado da urbe e fora de seus contextos. Pareceu-me mais uma maneira de amenizar as tensões com o subúrbio que uma demonstração de 'diálogo urgente' com ele. Acho que dar uma parede para um pichador e dizer que ali ele pode pintar sem problema é simplesmente retirar toda significação social e toda transgressão que trouxeram a pichação até aqui. A exposição me soou como uma anestesia: um discurso que serve muito mais para iludir do que para mostrar. Sem contar que fazer uma vernissage popular, a base de cerveja e sarapatel, foi constrangedor como todo surto pseudo-social em ambientes altamente burgueses. Ok, podem alegar que a visibilidade desse material num museu é um processo de legitimação importante para os jovens pichadores, mas acho que essa legitimação pacífica não funciona muito bem. Passei um bom tempo com isso engasgado, porque a permissividade, para mim, nada tem a ver com pichação e isso é um dos seus trunfos numa época em que o próprio conceito de arte está em questão. Um dia isso teria de ser percebido e acho que o foi, numa ótima sacada do estudante paulista Rafael Augustaitiz de 24 anos. Prestes a se formar no curso de Artes Visuais do Centro Universitário de Belas Artes, em São Paulo, ele - bolsista integral e pichador desde os 13 - resolveu apresentar como conclusão de curso, além de um texto de 28 páginas (vou atrás), uma intervenção de 40 pichadores no espaço acadêmico. Obviamente sem aviso prévio. Daí vocês imaginam que rolou o maior pau com os seguranças, correria louca de acadêmicos para lá e para cá, pichação geral, spray na cara, Rafael e mais seis presos e um ato que, para mim, é muito mais relevante que qualquer exposição ou enquadramento num museu. Quem quiser ler a matéria, originalmente publicada na Folha de São Paulo dessa última sexta, pode entrar aqui. Fiquei com preguiça de scannear e achei que o texto não deu voz sufiente ao artista. Essa parte da matéria resume um pouco o que estou dizendo ou tentando dizer: "Rafael amanheceu o dia de ontem em companhia de mais seis acusados de pichação no 36º Distrito Policial, no Paraíso. Duas estudantes de publicidade da Escola de Propaganda e Marketing, que fica em frente à Belas Artes, estavam lá também, exigindo: "Essa gente tem de se ferrar." As duas acusavam o grupo de pichadores de riscar o Honda Fit cor de champagne que saiu da concessionária "há menos de uma semana". ¬¬. Acho engraçado que na frente do Mamam, no dia da vernissage da exposição 'Estética da Periferia' não faltaram Hondas Fit. Uma pena que as pichações estavam todas lá dentro.

13

Pensei em escrever algo sobre a sexta feira 13, daí fiquei macucando um conto pessoal com bastante sangue e horror seguido de um relato de sessões cinematográficas infantis, mas depois que minha gata preta meteu o nariz no galão de tinta, deixando seu focinho azul, achei que a data-coincidência merecia passar desapercebida. É bonito quando você, angustiado e desanimado, procura no dia-a-dia, nos misticismos casuais e na suja caixa de lembranças uma inspiração cruel qualquer e termina recebendo uma expressão animal tão boba.

Não tem desânimo que resista.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Dica-do-dia

Às vezes o melhor a se fazer é assistir um filme muito, muito ruim.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Abecedário

Esse aviso vai bem de última hora, mas queria convidar todos para a exibição da primeira parte do 'Abecedário de Gilles Deleuze', que vai acontecer amanhã (12/06), no segundo andar do CFCH, a partir das 18:00. Dado o tempo da entrevista em vídeo, 450 minutos para ser exato, o encontro terá de ser interrompido no meio, para então prosseguir na quinta seguinte (19/06). Infelizmente, pelo que o pessoal do curso de História me informou, o material vai ser passado numa televisão. Numa televisão 'grande', e nem me perguntem o que isso significa, mas numa televisão. Segue o abecedário e os palavras-chaves:

A de Animal

B de Beber

C de Cultura

D de Desejo

E de Enfance [Infância]

F de Fidelidade

G de Gauche [Esquerda]

H de História da Filosofia

I de Idéia

J de Joie [Alegria]

K de Kant

L de Literatura

M de Maladie [Doença]

N de Neurologia

O de Ópera

P de Professor

Q de Questão

R de Resistência

S de Style [Estilo]

T de Tênis

U de Uno

V de Viagem

W de Wittgenstein

X de Desconhecido

Y de Indizível

Z de Ziguezague

Para quem não pode ir, não quer ir ou não tem saco de ficar diante de uma tela vendo um filósofo doente terminal, e ciente de sua morte, falando sobre o que quer por várias e várias horas, é possível ler toda entrevista aqui. Eu recomendo e não que isso seja grande coisa. Agora, se ainda assim você não se interessa m-e-s-m-o, lembre que ainda existe na locadora a possibilidade de alugar a versão Xuxa dos fatos.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Breads, Cookies, Kisses...

A primeira coisa que pensei quando terminou My Blueberry Nights aqui na tela do computador foi: 'Norah Jones, minha filha, você devia ter ido buscar a Rachel Weisz ou a Natalie Portman ou ambas para o Jude Law e depois ter sumido pra sempre da história'. Óbvio que não foi assim que aconteceu. Infelizmente. Não ligo como isso vai soar, mas acho que o Wong Kar-wai devia mesmo era ter feito um filme só com o Jude Law. Ou só com o personagem do Jude Law, Jeremy, que no corpo do Jude Law me pareceu muito bem. O diálogo dele, em seu charmoso café, com uma possível ex-amante chamada Katya, interpretada pela Cat Power, enquanto fumam cigarros enrolados e tendo como premissa o fato dela ter voltado para partir definitivamente só me fez lembrar dos versos batidos de In My Life, dos Beatles. Brega pra caralho, mas é isso aí. Eu sei que perdi a linha durona, costumo ser bem mais ácido que isso e já estou até com vontade de me esconder debaixo daquela mesa, mas toda essa coisa de reencontros afetivos, de despedidas emotivamente obrigatórias e de voltar aos lugares, histórias e pessoas marcantes são típicos exemplos do que acaba me comovendo. Já é de praxe. Eu sei, piegas até dizer 'chega dessa conversa' ou 'me poupe, meu senhor', mas isso é o que termino escrevendo aos fins de noite de segundas-feiras amargas. Segue o diálogo só pra constar:

Katya
Still rolling your own cigarettes?

Jeremy
You want one?

Katya
Yeah

...

Katya
Tastes different.

Jeremy
It's probably just been.
in my pocket too long.

Katya
It's a shame you can't.
smoke in cafes anymore.

Jeremy
You can't smoke anywhere anymore.

Katya
You should've changed the place.
It's not that much different

Jeremy
I've been meaning to buy new chairs
but I couldn't never find any that match
the tables and the tiles

Katya
Shouldn't be hard
Maybe you're just looking
in the wrong places or maybe
you're just sentimental

...

Jeremy
You look lovely

Katya
I'm starting to look like my mom

Jeremy
It's better than looking like your dad
I've seen photos of him

Katya
You still have the keys?

Jeremy
Yeah... I always remember what you said
about never throwing them away,
about never closing those doors forever. I remember

Katya
Sometimes, even if you have the keys
those doors still can't be opened, can they?

Jeremy
Even if the door is open
the person you're looking
for may not be there, Katya

Jeremy (OFF)
A few years ago, I had a dream.
It began in the summer
and was over by the following spring
In between, there was
as many unhappy nights
as there were happy days
Most of them took place in this cafe
And then one night
a door slammed and the dream was over

Katya
I should be going
I have to catch a flight in the morning.
Thanks for the smoke.
You know, I didn't even think
you'd still be here

Jeremy
Why'd you come?

Katya
I guess I just wanted to see
if I could remember
what it felt like

...

Katya
Goodbye, Jeremy

Jeremy
Bye, Katya

Ok, My Blueberry Nights podia ter também o David Strathairn e sem dúvida a Rachel Weisz, mas ainda assim, mesmo com esse assumido gosto por atores, atrizes e personagens em contraposição ao desgosto por atores, atrizes e personagens (leia-se Norah Jones e Natalie Portman no clima Crossroads), prefiro sem sombra de dúvida as atuações e as banalidades filosóficas de Amores Expressos (1994), Anjos Caídos (1995) e Felizes Juntos (1997). Acho que apenas o Jude Law, suas chaves guardadas - e cada história de amor para cada chave - além de sua câmera de segurança que o registra todos os dias conseguem manter o ritmo cotidiano belo e reflexivo dos velhos tempos. Talvez para constar nos anais de quem disse o que, valha a pena lembrar que a fotografia e a direção de arte continuam arrebentadoras: muitas cores, sobreposições, brincadeiras com texturas, velocidades para cá e para lá e fica muito claro como técnica por técnica não sustenta nada, nem ela mesma. Wong Kar-wai é mais que isso. Em My Blueberry Nights, as características tão caras ao cineasta deixam de ser vivas para se tornarem monumentos, instituições. O que é uma pena. O inglês não lhe fez muito bem. A América não lhe fez muito bem. E antes de ir embora, queria dizer que 'The Lady from Shangai', o tal filme do Wong Kar-wai com a Nicole Kidman, já está virando o 'Chinese Democracy' do cinema. Como assim ainda em pré-produção?

sábado, 7 de junho de 2008

Extras

A melhor surpresa cinematográfica da semana foi Romance e Cigarros (2005), escrito e dirigido pelo ator John Turturro e produzido pelos agora já bem famosos irmãos Coen. Pra começar, comprei o filme sem expectativas e sem informações, por míseros R$ 2,50 num pirata chuchu beleza da rua do Hospício. Espero que os artistas da tela grande não se importem, mas, todo começo de mês, vou lá e faço minha feira mensal. 8 filmes por R$ 20,00. Vem até com 8 dias úteis de garantia e a variedade de DVDs foge um pouco da concorrência vizinha, da programação multiplex, dos dvds de brega-rapariga-é-você e das putarias de famosos em geral (lembrando sempre que a cultura trash também pode ter lá o seu charme). Só para termos uma idéia, nessa mesma compra adquiri O Pagador de Promessas (1962), do Anselmo Duarte, Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver (1967), do José Mojica Marins, A Guerra do Fogo (1981), de Jean-Jacques Annaud e Piaf (2007), do Olivier Dahan. Mês que vem, entretanto, o pornô da Leila Lopes, 'Pecados e Tentações' já está garantido. Numa entrevista tosca e recente, ela disse que escolheu o ator com quem iria 'contracenar' a dedo. Resultado: deu o papel a um rapaz chamado Carlos Bazooka. Entendo que depois de tanta plástica no rosto, ela ainda queira ver o mundo rodar-rodar-rodar e rodar. Enfim, é por essa e outras que adoro a pirataria lá do centrão da cidade e lá de Casa Amarela. É menos cult que a Classic, convenhamos, mas é absolutamente o tipo de comércio que me dá orgulho de existir e nem me venham falar sobre direitos autorais, propriedade intelectual que esses temas já estão muito fora de moda. Simplesmente não fazem mais parte do espírito de meu tempo. Para quem o nome John Turturro não significa muita coisa, vale lembrar que como ator ele fez seu debut numa pequena participação em Touro Indomável, atuou em vários filmes independentes legais, trabalhou com Spike Lee e com os já citados irmãos Coen, ganhou dinheiro em filmes comerciais (tipo o recém Transformes) e até já levou o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes em 1991 (por sua atuação em Barton Fink). Comumente o colocam como um dos artistas mais representativos da sua geração, eu até concordo, mas particularmente fico receoso com esse tipo de elogio. Parece-me como o resumo do resumo do resumo de um artista esquecendo o que, de fato, ele já fez. Ok, talvez eu esteja exagerando.

Voltando a Romance e Cigarros, vale dizer que comprei o DVD basicamente porque não conhecia as aventuras do John Turturro no campo da direção. Gostei do resultado. Acho que vou buscar até os outros dois: Mac (1992) e Illuminata (1998). Se estes tiverem metade das sacadas do último já vale arriscar. O filme em questão não é uma prova de gênero - não é apenas um musical - mas também um musical. Não sei se perdi o fio da meada, mas enxergo a obra como um ensaio em que o diretor debate a idéia de que o gênero não pode mais ser colocado apenas como organização estrutural do cinema, ou das ocadoras, e sim como linguagem re-significada, transformada (algo que O Hospedeiro também traz de outra forma). Cria-se assim uma história de amor que passeia sem constrangimentos por vários estilos até o fim. Começa com a filha, Mary-Louise Parker, acendendo um cigarro e o colocando nos dedos do pai que dorme e ronca no sofá da sala. Não sei porque, mas adoro brincadeiras de mau gosto 'só pra começar'. Em seguida, temos uma briga de casal entre a Susan Sarandon e o James Gandolfini, o que nos remete a um drama doméstico sobre traição e redenção, que se mantém tencionado entre uma comédia louca fundada num humor negro bem irmãos Coen, com saídas malucas de roteiro e uma comédia melosa-romântica, com uma inteligência bem acima da média. Tudo isso temperado por um tom musical e pelas fugas de realidade típicas dos musicais, o que me soou altamente moderno (e a clara afeição pelas canções ajudou tudo). Por fim, volta o drama pesado a partir de uma doença terminal causada pelo cigarro, que abate justamente o patriarca da família entorno do qual toda trama se desenvolve. Esse momento é suavizado apenas pela leveza ou beleza de condução formal do diretor e cheguei a ficar preocupado na aparição de um possível discurso de culpa, o que não acontece. O cara morre com classe: fumou a vida toda, sabe que vai morrer logo mais, o quadro é irremediável e continua tendo a nicotina como sua verdadeira garota. O John Turturro segurou a onda do personagem até o fim. Digo que segurou até para além da geléia geral de gêneros, o que numa descrição primária pode parecer confuso, mas que, pelo contrário, funciona muito bem. Principalmente porque nos (ou me) joga pensamentos, brincadeiras daquelas que perdemos e criamos todos os dias, além de carregar consigo uma reflexão sobre o que é o gênero de um filme no cinema contemporâneo. Uma piada, só isso. E até uma piada boa de vez quando. Sem contar que chega ser absurda a quantidade de reações diferentes que cada unidade causa. Numa hora estava gargalhando de doer a barriga e logo depois, quando menos espero, estou cantando 'A Man without Love' junto com o Gandolfini pra na sequência ficar abatido, triste; então sentir como o amor é brega mesmo, ficar emocionado e só superar quando o Christopher Walken entra em cena, com um claro caráter-cafajeste, cantando Trouble, do Elvis. Quase pulo do sofá e não demora muito até estar gargalhando novamente. Putz... John Turturro dá uma aula. Nem Barton Fink faria tão bem.

Gostei tanto do filme que resolvi, atitude não tão comum para mim, investigar com cuidado os extras um por um. Duas coisas me chamaram a atenção. Primeiro foi a típica seleção de cenas excluídas blá blá blá. Diferente de boa parte dos filmes, aqui as cenas funcionam como pedaços descontínuos do filme, como se pudessem fazer realmente parte do filme, de tal modo que podemos até sentir como se aqueles trechos integrassem a obra. Numa delas, há um diálogo entre o James Gandolfini e o Steve Buscemi, provavelmente uma das cenas melhor escritas do filme - opinião do próprio diretor - que termina fora do recorte final. É interessante perceber que a cena não foi incluída, porque ela iria se tornar retórica diante do que implicitamente já foi trabalhado no filme. É uma cena até de um tom mais filósofico sobre o velho amor, traição e redenção ali de cima, mas por ser do fim era simplesmente óbvia e explícita demais. Já tínhamos entendido tudo. Por isso, rolou a exclusão que como eu disse não é bem uma exclusão, mas uma descontinuidade. Só pra lembrar de outro extra, mais divertido ainda é quando o John Turturro fala que algumas daquelas filmagens foram feitas só por diversão. Quase como um estímulo ao poder criativo do improviso: sua prima está na cama e começa a dizer que precisa beijar, precisa beijar, então um técnico de som tira a roupa e entra em cena para seduzi-la. Ela continua a cena até que começa a rir. Hilário. O melhor é que o filme todo parece filmado na linha just for fun. A segunda coisa sobre os extras é que pela primeira vez ou terceira vez, resolvi assistir a um filme, depois da primeira sessão, com os comentários do diretor no lugar do som original. Sempre achei esse recurso dos DVDs um excesso desviante da obra em si. Não mudei tanto de idéia. É excessivo, é puramente um culto aos entornos da obra, se baseia em detalhismo, é procurar saber todas explicações para todas as escolhas... e assim indefinidamente. Mas não sei bem se isso enevoa a obra. Não aconteceu. Estou bem com isso. Acho que vou até ali baixar a trilha sonora do filme.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Sobrando glamour

O meu blog foi recentemente linkado num tópico da comunidade do orkut Antiglamourização das Drogas. Obviamente fiquei bem curioso para saber qual era a discussão e em que contexto o link tinha surgido. Daí achei estranho que isso aconteceu no post de um cara que estava tratando a legalização da maconha como jogada financeira, destruição moral e defendendo que essa decisão não teria relevância alguma social. Até aí tudo bem, é a opinião do cara e eu respeito. Da mesma forma, tinham outros falando dos benefícios, tal, tal, tal. MTV Debate do orkut. A questão é que o link remetia a um post meu antigo sobre cigarro, no dia em que foi proibido fumar em ambientes fechados no Recife, e basicamente falava como detestava campanha anti-tabagista. Ainda odeio, por sinal. E depois de 'polígono da maconha' pra cá, 'viciado safado' pra lá percebi a distorção do meu texto no meio daquela geléia senso comum: lendo todo post, percebi que o cara é meio que a piada da comunidade, um radical anti-drogas com pérolas ótimas e dramalhões 'xô droguinha' impagáveis. E foi justamente ele que usou meu pobre post para fundamentar 'com dados' sua idéia que a proibição sempre traz consigo diminuição. Vigiar e punir. Tem uma coisa que me deixou encucado: que dados, meu senhor? O meu post é altamente pessoal e simplesmente não tem nada a ver com os argumentos dele até então. Acho que no meio de tanto link, ele resolveu colocar alguns sem ler só pra fazer volume. Nem preciso dizer o que acho dos discursos que precisam desse tipo de recurso.

Só pra fazer parte da brincadeira, mano


1) acesse http://en.wikipedia.org/wiki/Special:Random - o título da primeira página aleatória que aparecer será o nome da sua banda.

2) vá pra http://www.quotationspage.com/random.php3 - as últimas quatro palavras da última frase da página formarão o título do seu disco.

3) acesse http://www.flickr.com/explore/interesting/7days/ - a terceira foto, não importa qual seja, será a capa do seu disco.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Corinthians 3 X 1 Sport

Essa coisa de torcer não dá certo. Sempre gostei de futebol, sou meio alucinado por Copa do Mundo, mas no tempo do colégio só conseguia ganhar mesmo na feira de ciências e no xadrez. Ok, também ganhava no videogame e no War, mas esse último não valia medalha, nem glória nerd e quase sempre eu deixava meu lado ladrão descarado entrar em campo. Tudo bem que hoje se joga com a troca de cartas assumida, mas na minha época tudo era por debaixo da mesa. Eu sou meio assim: todo jogo desses bobos, principalmente com gente boba e que dá pra roubar, eu roubo mesmo. E quando é jogo de cartas então, com blefe, tapa na testa, troca de cartas por debaixo da mesa, caio na jogatina total. Pensando hoje fica meio como coisa de brasileiro: a culpa não é minha, a culpa é de quem não é esperto e se deixa roubar. Quem por exemplo nunca roubou dinheiro no Banco Imobiliário ou no Jogo da Vida? Hoje eu já teria conquistado de verdade a América do Sul, a Europa e um terceiro continente a minha escolha. Nem preciso dizer que gato por lebre é fichinha. Bom mesmo era no tempo da bolinha de gude, quando eu estava perdendo e gritava ou alguém gritava 'olha o rapa' e pegava as bolinhas dos amigos pivetes e corria pra casa. Sempre tinha um loser chorão que ia contar pra mamãe. Ficava puto, afinal eu também era loser e nem por isso era chorão. Eles não entendiam que 'o rapa' era só outro jogo. Também existe uma lógica de que quando encontrava um igual, não me arriscava a roubar ou já partia pra formação de quadrilha. É como um trato de respeito ao bom adversário, um trato de malandro. Mas sim, voltando ao futebol, ano passado eu estava cagando e andando pro Sport - aparentemente o meu time do coração desde pequeno - fui até pra alguns jogos do Náutico, mas depois do dia 31, fiquei do tipo o torcedor rubro-negro número 1. Só não vou pra campo, porque aí já é demais pra mim. Só entro em campo se for pra jogar no gol e ser campeão, mané. tipo na Copa Paulo Francis do pessoal de jornalismo. Mas no caso do Sport pelo menos sei o nome dos jogadores, sei quem é bom, sei quem é ruim, xingo, faço comentários macho alfa, dou dicas de estratégia e não podia deixar de dizer que puta merda, eu odeio o Corinthians. Muito mesmo. Também é um ódio desde pequeno. ok, estou tentando esconder que to puto porque o Sport perdeu ontem, mas vale dizer que fico mais puto ainda porque o Timão é simplesmente a equipe brasileira de futebol que mais aparece na televisão aberta e que tem mais repercussão na mídia do país. Pelo menos para o nordeste e não é de hoje, de ontem. Como pode? No time do Corinthians ladrão é bóia de tal modo que fica difícil não pensar que o juiz ta comprado, que tal e tal jogador pode ta comprado também. Tento não pensar mais fica difícil diante da história do futebol brasileiro. A equipe está sempre envolvida nas maiores mutretas do futebol brasileiro e mesmo rebaixado, tripudiado continua tendo jogo transmitido e sempre ocupa um espaço religioso em todos os programas esportivos da paróquia. Isso também me parece um jogo barra pesada. Definitivamente essa coisa de torcer não dá em nada, principalmente quando o seu time não joga nada, tudo parece roubo e quando você vê, você está diante do time que mais odeia do país. Por que mesmo Lula torce pro Corinthians? Abuso geral.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Curto Circuito

Só achei estranho quando Paulo Caldas falou na Aliança Francesa que Amigos de Risco, de Daniel Bandeira 'já estava aí no circuitão'. Só faltou o bombando no circuitão. Um pouco exagerado, eu diria, afinal um único horário na semana, exatamente às 19:15, apenas na quinta-feira, apenas no Shopping Tacaruna não é bem o que podemos chamar de circuitão né? É algum avanço em termos de visibilidade comercial digamos, mas nada perto da quantidade de salas e horários que qualquer outro filme tem nos Mutiplex da vida. Nada perto mesmo. Só para termos uma idéia, As Crônicas de Nárnia, por exemplo, está atualmente com 47 sessões espalhadas em 13 salas do Recife. Indiana Jones eu não preciso nem dizer. Tudo bem que o que interessa nessa lógica é o dinheiro da programação, depois pensemos na qualidade dela, mas acho que dois horários é o mínimo que se pode dar a um filme. Dois horários, 176 minutos no caso de Amigos de Risco. Definitivamente as Sessões de Arte (ou sessões especiais) da cidade do Recife são bem ingratas aos cinéfilos desmotorizados, feios, trabalhadores noturnos e que moram longe. Por isso, sou um total defensor das sessões matutinas, acho que é uma discussão que poderia entrar em pauta em tempos de crise da tela grande. O Shopping Boa Vista já faz isso aos sábados. É uma alternativa. Há duas semanas assisti Homem de Ferro na sexta de noite e Família Savage no sábado de manhã e não é que, seguindo outros sábados, o segundo filme tinha um público bem, mas bem maior que o primeiro? Está na hora do Multiplex se tocar, sair um pouco do padrão e começar a rebolar.

Mas voltando ao circuitão, espero que daqui um tempo, Amigos de Risco entre em cartaz no Cinema do Parque. R$ 1,00 e várias sessões. Boto a maior fé e acho que só vou escrever um texto decente sobre o filme depois dessa experiência. Saí do Cine PE já pensando nela: nos estudantes gritando, nos velhos moradores da Boa Vista, nas bichas da Fun Fashion, nos trabalhadores de todo canto, no pessoal que paga o ingresso só pra dormir. Quero rever o filme de Daniel Bandeira e quero rever no Parque. Obra e local de exibição conectados profundamente. Ponto. E para não fechar esse post em clima de reivindicação panfletária - o que não é muito lá a minha praia - resolvi descontrair lembrando uma resposta e um complemento hilário de Paulo Caldas. Ao ser perguntado se a visibilidade internacional de diretores brasileiros ajudava o cinema brasileiro internacionalmente (e o que dizer do 'nacionalmente'?), ele respondeu com uma cara desconfiada que ajudava sim, mas que esse interesse muitas vezes se resumia a um determinado cinema brasileiro: atualmente, o vinculado a figuras e/ou produtoras de Fernando Meirelles e Walter Salles. Esse último mais conhecido como 'Walteza' nos bastidores-conversas-entre-cineastas-não-tão-famosos. No final das contas, da microesfera a macro, volta o debate do cânone vivo - eleito por efeito comercial ou artístico - e tudo parece se resumir numa mera luta por espaço. E aí não tem como deixar de falar nas cotas para o cinema nacional, atitude que me deprime, mas que me deprime mesmo porque é uma puta saída paliativa necessária e ainda ínfima.

Encontro Marcado

Estava eu dirigindo sábado tranquilamente, quando paro num sinal da Rua Amélia, atrás de quatro ou cinco carros e escuto um jornaleiro anunciando o 'Diário' e o 'Commercio'. Até aí tudo bem: o jornaleiro estava passando fila por fila mostrando as capas do domingo e antes de chegar a minha vez, fiquei curtindo e tentando imitar a entonação da venda. Sou fan daquele sotaque malandro 'Diááááario' / 'Commeeeercio' que deve até funcionar como pré-requisito para a profissão. Também percebi que, mesmo com vários exemplares debaixo do braço, é bastante raro anunciarem a Folha de Pernambuco. Talvez o nome não tenha a sonoridade adequada ao sotaque ou talvez na área da Rua Amélia, dentro dos carros, sejam poucos os interessados pelo jornal 'popular' de Recife. Quem compra a Folha tem que ir atrás e com os pés no chão de preferência (literalmente ou metaforicamente). Antes do sinal abrir, dei uma olhada na capa do JC e tive como reação natural fingir uma crise de pânico dentro do carro. Olhei para todos os lados, tranquei as portas, fiz cara de horror, gritei e depois tive uma puta crise de riso. O jornaleiro percebeu e me olhou com uma cara de 'que pessoa mais estranha'. Afe... me desculpem os roubados do meu Brasil e os com síndrome do pânico, mas definitivamente o encontro de um motorista tranquilo com aquela capa de jornal não podia sair sem uma cena e também jamais irá acontecer de novo. Por isso, fiz questão de repetir o personagem em todos os sinais seguintes.


domingo, 1 de junho de 2008

Paulo Francis

Esse mundo anda muito estranho. Outro dia vi que uma tempestade de areia originada no deserto do Saara chegou em Colônia, uma cidade da Alemanha. São cerca de três mil quilômetros de distância. Daí na matéria foi dito que o dia virou noite, mas pelas imagens víamos que, na verdade, aquilo não era nem dia, nem noite. O céu ficou estranhamente amarelo. Depois vi uma matéria no Jornal do SBT dizendo que 'segundo pesquisadores americanos' parar de fumar é contagiante. O foco da matéria era explicar que largar o cigarro em grupo é algo mais simples que uma decisão individual. Óbvio. Entretanto, a matéria seguindo uma linha musical MGM e spam de e-mail, parecia mais uma epidemia do bem mundial 'venha conosco, apague seu cigarro e repasse essa idéia'. Acho tão breguinha esses surtos do bem: 'sou do bem bem, venha você também'. Argh! Poderia citar os ladrões que assaltaram lojas disfarçados com biquinis fio dental no rosto. Nada, entretanto, foi tão estranho quanto ser campeão de uma competição de futebol. Não é de se espantar que tenham me pergutado se o outro time era composto por deficientes. É que não faço muito o tipo 'jogador-u-hu-de-futebol'.